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A Bicha Serpe e a Marca do Fogo


The story of Daniel, Bel and the Dragon, Philips Galle & Maarten van Heemskerck, 1565


Durante os dois últimos milénios o Dragão foi associado ao mal, pela referência a um símbolo demoníaco no Livro do Apocalipse Segundo S. João[1], e ainda nos Livros de Isaías[2] e Jeremias[3], com raiz no Antigo Testamento. Quando procuramos a origem das referências do apóstolo e profetas cristãos, remetemo-nos ao século II A.E.C, mais precisamente à narrativa de Bel e o Dragão[4], o capítulo XIV da parte deuterocanónica do Livro de Daniel de origem aramaica. Na narrativa, Daniel ridiculariza a adoração de ídolos divinos, matando o dragão Bel, título que era usado para designar várias entidades divinas na Mesopotâmia, nomeadamente na Acádia, Assíria, Babilónia e Suméria.

Relevo de Palmira do início do século II D.E.C. com representações de

Bel (à esquerda), Baalshamin, Iarhibol e Aglibol.


Esta narrativa mostra-se importante como fundamento da compreensão da mudança de paradigma das crenças religiosas durante os últimos milénios. Esta visão espalhou-se depois pela Grécia, com a tradução para o grego da narrativa de Bel e o Dragão na Septuaginta[5], e mais tarde assistimos a uma mudança clara do politeísmo para o monoteísmo com a ascensão do Judaísmo, e actualmente, por grande parte do mundo ocidental, com o Cristianismo. Nesta mudança de paradigma do culto religioso, com a adopção de uma visão monoteísta da divindade, perdeu-se o discernimento da importância das entidades como Bel, símbolos do fogo divino e da luz zodiacal.

Das várias memórias de povoações castrejas no norte de Portugal, uma em especial, o Castro de Monte Mozinho[6], tem bem perto uma celebração cristã onde a Serpe[7] é motivo de atenção. Na procissão do Corpo de Deus, celebrada por altura do Solstício de Verão desde o século XVII, um ícone da Bicha Serpe é levado pelas ruas da cidade, puxado por uma corda na frente da procissão. A Serpe, ancestral símbolo do fogo interno da alma, caiu na simbologia da reclusão do animal da luz. Ao mesmo tempo a tradição lembra a Bicha, reminiscências das quimeras de outrora.


[1] Apocalipse 12:3-4 [2] Isaías 46:1,3 [3] Jeremias 50:24 e 51:44 [4] Livro de Daniel 14:23-30 [5] Septuaginta 4-39 [6] O Castro do Monte Mozinho, também conhecido como Cidade Morta de Penafiel, situa-se entre as freguesias de Galegos, Oldrões e Valpedre, no conselho de Penafiel, distrito do Porto. [7] A Serpe é um réptil semelhante a um Dragão, porém com apenas duas patas, e era frequentemente usada nas heráldicas medievais.

 

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